Geração do consumo e seus abusos

segunda-feira, 11 de agosto de 2014

Em uma sociedade cujo ídolo é o consumo, quem não consome está fora de moda. Simples assim. E quem é um pouco menos manipulável é taxado de pão-duro e sovina, como se ter a capacidade de escolher não gastar em detrimento de uma economia maior ou de um gasto mais responsável fosse um defeito ao invés de uma qualidade. Nessa sociedade de valores invertidos, pseudo-políticos sem muito o que fazer encontram brechas para mostrar serviço de formas inusitada, para não falar inadequada.

Uma resolução do ConselhoNacional dos Direitos da Criança e do Adolescente lançada em março deste ano considera abusiva toda e qualquer publicidade voltada ao público infantil. Segundo a resolução, uma inocente propaganda de produtos voltados justamente para o publico infantil seria condenável. Até a programação infantil foi retirada das grades dos canais televisivos e substituída por mais programas para adultos.

Televisão agora é coisa exclusivamente para adultos. Só que não avisaram as crianças. Nem os pais. Infelizmente, vivemos em uma geração em que os pais não querem dispor de seu tempo (nem esforços) para educar seus filhos, e a televisão tem sido um grande aliado nessa onda de preguiça (negligência?) generalizada. Está tudo bem enquanto a criança está hipnotizada pelo aparelho eletrônico, pois assim sobra mais tempo para os pais fazerem o que bem entenderem. Mas se antes já estava ocorrendo um processo de aceleração no amadurecimento de uma criança e encurtamento de sua infância, exposta de forma massiva ao mundo dos adultos, esse processo tem se tornado alucinante.

Entrevistada a respeito desse assunto, a empresária Mônica de Sousa, filha do cartunista Maurício de Sousa, deu uma excelente entrevista ao jornal O Globo (que pode ser conferida na íntegra aqui). Entre vários argumentos extremamente pertinentes, Mônica lembra que é muito fácil cobrar o governo por coisas que têm relação com a educação básica que é responsabilidade dos pais. A obesidade e o consumo em massa, por exemplo, são coisas que poderiam ser resolvidas com uma educação digna, com pais presentes exercendo seu papel e dizendo não à criança quando achar que é necessário.

De um lado, algumas linhas de psicopedagogia modernas dizem que a criança tem que ser deixada livre para escolher o que quer, pois assim é a criança moderna: ela tem que ter opções. Por outro lado, essas teorias não oferecem uma solução para as consequências da escolha da criança. Se algo dá errado, os pais têm que remediar e o filho sai de cena sem ter levado um aprendizado consigo. Além disso, vivemos um momento econômico muito diferente do de nossos pais e avós. Se no passado uma criança tinha que tolerar um “não” porque os pais não tinham como bancar suas vontades, hoje os pais financiam todos os desejos dos filhos, seja por não suportarem a manipulação que estes lhe aplicam (na forma de birras e malcriações nunca repreendidas, especialmente em público), ou porque acham que os filhos não “merecem passar necessidade como eles passaram no passado”.

O equívoco nesse pensamento dos pais é que eles não percebem como as crianças perdem com uma atitude firme de uma negativa. Eles se esquecem de que foi justamente o fato de seus próprios pais terem lhes negado algo por necessidade que os tornou os adultos que são hoje: que sabem que têm que trabalhar para conseguir o que querem, e que sabem que nada é dado de graça. E mais: que não precisam mais de seus próprios pais para sobreviver no mundo, pois já estão preparados para isso.

A infância é uma parte muito importante no desenvolvimento de qualquer ser humano, e para tal, como em todas as fases da vida, tem suas especificidades, como suas brincadeiras e produtos próprios. Aprender com as brincadeiras e usar produtos adequados à idade auxiliam – junto à obrigação inerente aos pais, quer eles gostem ou não – no desenvolvimento tanto psíquico quanto físico das crianças. Atropelar essa etapa com uma lei estapafúrdia e que exime os pais de sua tarefa de educadores primários é que deveria ser considerado um absurdo. Graças a esse tipo de medida (entre outros fatores) estamos vivenciando uma geração de crianças crescidas (com seus mais de 20 anos) que nunca conseguem alcançar de fato a idade adulta e que, justamente por isso, passam pelo que os pais mais temiam: o sofrimento exagerado ao ser contrariado.

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